Quem fez História na Orquidofilia Brasileira
Aniel Carnier
Aniel Carnier, uma ícone na nossa orquidofilia, contava que já passou por muitas dificuldades, mas nunca deixou as orquídeas de lado.
‘‘ Quando tinha 16 anos, seu pai ficou cego. Seus irmãos já eram casados e tive de administrar a padaria da família’’. Antes, Aniel trabalhava como mecânico na antiga Companhia Paulista. ‘‘Tive que parar de trabalhar e assumir a família, mas nunca minhas plantas. Qualquer tempo livre que tinha era para elas’’. Ele afirma que o fanatismo era tão grande que mantinha um catálogo de flores na gaveta do torno que operava. ‘‘Enquanto a máquina dava o passe de corte eu ficava estudando’’.
Por volta de 1950, ele viu um dendrobrium pela primeira vez, trazido por uma família de Santa Catarina que havia se mudado para Rio Claro. ‘‘ A partir de então, comecei a buscar aprender o que era uma orquídea e como cultivá-la’’. As dificuldades eram grandes pois, nessa época, não existia onde buscar informações. ‘‘O Circulo Orquidófilo de Rio Claro foi fundado quatro anos depois, em 1954’’.
Com a inauguração do espaço, foi a primeira exposição de orquídeas na cidade, em parceria com a Esalq e com um comerciante de Piracicaba. ‘‘Vi pela primeira vez uma flor branca, a Cattleya Júlio Conceição. Fiquei desesperado para tê-la em minha pequena coleção e dali não parei mais’’, explica Aniel. Ele define o amor às orquídeas como um vírus. ‘‘É uma contaminação que a gente pega e não consegue mais parar, ficando, muitas vezes até meio fanático pelas plantas’’. Em seguida à exposição,
Evaldo Wenzel, primo de Aniel, fundou o Orquidáriio Rioclarense, hoje administrado pelo filho de Evaldo, Cesar Wenzel. ‘‘Aprendi com eles, entrei para o círculo e já fui presidente cinco vezes’’, conta. Com o primo, Aniel aprendeu a semear, processo feito naquela época em pequenas caixas.
Outra oportunidade que aniel considera valiosa foi o trabalho na Esalq, com Amilton Bicalho. ‘‘Eu trabalhava lá aos finais de semana, ficava das 8h até 17h semeando para os alunos aprenderem’’. Para ele, a vantagem do trabalho era poder conversar com Bicalho, que ele considera ‘‘uma sumidade em orquidofilia’’. Aniel também assistia às palestras do dr. Gurgel, geneticista da universidade. ‘‘Ele dava muitas dicas sobre cruzamentos de orquídeas’’. Entretanto, o grande auxílio em orquidofilia veio de Rolf Altemburg, proprietário da Florália , de Niterói, RJ. Aniel já comprava plantas da empresa e quando Rolf veio a uma exposição em Rio Claro, em 1967, quis conhecê-lo. A partir daí os laços de amizade foram se estreitando e, todos os anos os dois se encontravam novamente na cidade do interior paulista.
‘‘Quando Rolf conheceu meu pequeno orquidário, falou para os amigos que iria me dar um empurrãozinho’ porque eu ia bem. Acho que ele me deu foi um chute, porque me ajudou demais’’,diz emocionado. Segundo Aniel, Rolf Altembug muitas vezes comprava matrizes fora do Brasil e dava de presente ao amigo de Rio Claro. ‘’Ele me convidou para ir trabalhar com ele, mas não podia abandonar meu pai’’. O proprietário da Florália pedia a Aniel que fosse a exposições e observasse as plantas. Quando visse algo excepcional, a ordem de Rolf era que a orquídea fosse comprada. ‘‘Ele confiava no meu conhecimento’’. No inicio da década de 70, Aniel foi a uma exposição em
Piracanjuba, GO. ‘‘Lá eu vi uma Cattleya semi-alba, planta rara até hoje. Ficou maluco, mas o mateiro queria 500 cruzeiros pela orquídea. Eu não ganhava esse dinheiro em um mês!’’,exclamou Aniel. Entretanto, pediu ao vendedor um prazo de 15 dias para falar com Rolf. Voltou a Rio Claro e entrou em contato com o amigo. ‘‘Ele pediu que eu fosse buscar a planta e levasse até Niterói para ele’’. Chegando lá Aniel conta que Rolf colocou a planta em cima da mesa, escorou e ficou admirando sua beleza. ‘‘Faz mais de 40 anos que isso aconteceu, mas lembro com muita saudade’’.
Em outra ocasião, Aniel conta que conseguiu negociar uma planta com um colecionador japonês de Araçatuba que era muito difícil de lidar. ‘‘Só consegui a planta em troca de uma Laelia tenebrosa da minha coleção, com pétalas amareladas e labelo bem escuro, diferente das que você vê hoje em dia’’. Rolf queria pagar pela planta que Aniel havia dado, mas ele não aceitou. ‘‘Dias depois, recebi um veículo da Florália com 200 Cattleya “Sônia Altemburg”. Ele me ligou depois perguntando se a divida estava paga” diverte-se o orquidófilo.
Aniel, assim como Rolf, acabou se especializando em hibridação. “Quando eu pus na cabeça de fazer uma flor pintada, Rolf me aconselhou a começar logo enquanto ainda era moço”. Foram 17 anos cruzando plantas até chegar no padrão atual da Cattleya Pão de Açúcar e Cattleya Corcovado. Os nomes homenageiam dois dos principais pontos do Rio de Janeiro, de onde foram retiradas as primeiras Cattleya guttata utilizadas nos cruzamentos. As plantas têm uma representação muito forte fora do Brasil e são as preferidas de Aniel. “Provavelmente por causa do incentivo que o Rolf deu para que eu fizesse as plantas”, diz. Ele só tem uma tristeza em relação aos híbridos: não ter conseguido mostrá-los a Rolf. Quando saiu a primeira floração, o orquidófilo já havia falecido. “Foi uma amizade bonita, sofri demais quando a gente o perdeu, porque não entrava na cabeça. Na orquidofilia ele foi tudo pra mim”.
Uma grande emoção na vida de Aniel aconteceu em 1961, ao ter um híbrido registrado com o seu nome. Trata-se da Brassocattleya Pastoral semi-alba “Aniel Carnier”, registrada por Rolf Altemburg. “Ele se justificou dizendo que a planta e eu éramos parecidos: grandes e espalhafatosos”. Outra homenagem que tocou seu coração foi dada em 1999 pela cidade de Guaxupé, MG. Depois de dar palestras no círculo orquidófilo e criar um grupo de cultivo infanto-juvenil orquídeas, Aniel Carnier recebeu o título de “cidadão honorário”.
Atualmente, Aniel continua cultivando suas orquídeas em uma chácara afastada do centro de Rio Claro. O orquidário dele foi incluído na rota de turismo da cidade e diversas escolas o visitam para saber como as orquídeas eram semeadas antigamente. O amor ás plantas permanece. “Tudo o que eu consegui na vida foi por elas. Hoje eu vivo em função das plantas”, finaliza. Aniel Carnier faleceu em 27 de abril de 2008 aos 74 anos.
Créditos: Valdemir de Oliveira Ricci
Haruzi Iwasita
Em 1940, o produtor embarcou para o Brasil com sua dedicada esposa, Fusae Iwasita, com quem era casado há um ano, e teve três filhos : Jorge, Julieta e Antônia.
Em 1969, recebeu sua primeira orquídea, desde então, o amor por essas plantas só cresceu e se tornou uma motivação de vida.
Como produtor, Iwasita início seus trabalhos em 1977, juntamente com seu filho Jorge. No mesmo ano, foi premiado por suas orquídeas cultivadas durante uma exposição no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Com dedicação e empenho, Iwasita ajudou a difundir as orquídeas brasileiras no Japão no ano em 1987 durante a 12ª Exposição Mundial em Tóquio. Ele representou o Brasil com diversas espécies de orquídeas e foi premiado com medalhas de ouro, prata e bronze.
Três anos mais tarde, em 1990, Iwasita voltou ao Japão e fez uma exposição composto somente de orquídeas brasileiras. Na ocasião, recebeu das mãos da princesa japonesa Mikasa Nomiya outro premio pela sua criação.
Atualmente, seu filho Jorge dá continuidade aos conhecimento e ao trabalho do seu pai.
Créditos: Valdemir de Oliveira Ricci
Jean Baptiste Binot
Nos fins da metade do século passado, num pequeno lar francês, um casal era presa de terrível sofrimento. Morrera-lhe a filha querida, e, de repente, a vida perdeu todo o encanto para ele. O chefe do casal, Jean Baptiste Binot, decidiu que não poderia mais continuar vivendo na França. Adorava a filha, e aquele golpe inesperado e cruel fora forte demais e só o esquecimento poderia suavizar a sua dor. Mas, como esquecer, se ainda tinha nos ouvidos a música do riso da filhinha morta?
Na sua pátria, que ele tanto amava, esse esquecimento afigurava-se-lhe de todo impossível, pois os amigos, os parentes, as cantigas de outras crianças, ouvidas na sua própria língua, tudo lhe lembrava a cada momento a sua tragédia.
Desse modo, só seria possível o esquecimento fugindo da sua terra, emigrando para bem longe, onde nem mesmo o eco das suas tristes recordações pudesse ser ouvido.
E o Brasil desconhecido, com o feitiço dos trópicos, foi a terra que escolheu para a sua segunda pátria, aqui chegando em 1840.
Fixou-se primeiramente em Niterói, de onde, após algum tempo de permanência, transferiu-se para o lugar denominado Retiro, na cidade de Petrópolis, onde, em 1870, há quase um século, portanto, iniciou um estabelecimento hortícola. Nesse meio tempo havia conquistado a amizade pessoal do Imperador D. Pedro II, que lhe fez presente de cinco escravos e que mais tarde iria ser o padrinho do seu filho Pedro Maria Binot.
Não se encontram informações muito claras a respeito desse período da vida de Jean Baptiste Binot. Todavia, não há a menor dúvida de que desde a sua chegada ao Brasil demonstrou um grande interesse pelas coisas da nossa natureza, particularmente pela nossa Flora, e antes mesmo de instalar o seu estabelecimento comercial, já cuidava de organizar jardins particulares, tendo sido mesmo encarregado da execução do jardim do Palácio Imperial, hoje Museu Imperial de Petrópolis.
E D. Pedro II, que era um homem viajado e culto, certamente não o teria incumbido dessa tarefa, se não reconhecesse no jardineiro francês as qualidades exigidas para uma obra desse vulto.
Em 1861 o comércio do Rio de Janeiro ofereceu-lhe um belo presente, constante de uma riquíssima salva de prata, por notáveis serviços prestados.
Dez anos antes, isto é, em 1851, nasceu-lhe um filho, Pedro Maria Binot, que cresceu e fez os seus estudos na cidade de Petrópolis.
Pedro Maria criou-se no meio de plantas, admirando a natureza como o seu pai.
Em 1870, no mesmo ano em que o seu pai fundou a orquidicultura que ainda hoje conserva o seu nome, o jovem Pedro Maria seguiu para a Europa, onde permaneceu durante três anos na Escola de Horticultura de Gand, na Bélgica. Ali, em contato com os velhos mestres belgas, adquiriu um sólido conhecimento especializado, ficando inteiramente senhor do que havia de mais moderno em matéria de floricultura naquela época.
Ao regressar ao Brasil começou a exportar sementes de palmeiras, plantas ornamentais, e orquídeas, principalmente para a Bélgica e para a França.
Nessa época, passava 6 meses no Brasil, coletando e preparando o embarque de milhares de plantas, que acompanhava até a Europa, onde entregava as que haviam sido encomendadas e vendia as outras. Nessa ocasião recebia novas encomendas.
Saía daqui em abril ou maio e regressava em setembro. Levava orquídeas em caixas de madeira, muitas vezes 300 caixas. Essas plantas vinham de todas as partes do Brasil e eram as nossas embaixatrizes da beleza americana nas estufas europeias. Labiatas, de Pernambuco, Aclandiae e Amethystoglossa, da Bahia; Warneri, do Espírito Santo. De S. Paulo, o varicosum Rogersii, Do Estado do Rio, o crispum, o Marshallianum, o Forbesii e a Sophronitis. De Minas, uma variedade de crispum. De Santa Catarina, purpuratas. Foram dezenas de milhares de plantas que saíram do Brasil, muitas das quais foram utilizadas para a obtenção dos primeiros híbridos.
Pedro Maria Binot foi o introdutor de diversas espécies novas, algumas ainda hoje trazendo o seu nome.
Em Bruxelas, adquiriu uma estufa, que era uma espécie de entreposto de redistribuição, e para onde convergiam as plantas que exportava do Brasil e que recebia da Colômbia, da Venezuela, da América Central e das Índias.
Muitas das plantas desses países ele mandou para o Brasil, assim como diversos híbridos belgas e franceses, cujas flores cortadas eram enviadas aos floristas do Rio, para que o publico se habituasse a comprar orquídeas.E desse modo, até 1911, data da sua morte, Pedro Maria Binot, incansavelmente, inundou as estufas europeias com as nossas belas orquídeas, e mandou para o Brasil muitas espécies exóticas, num intercambio organizado e permanente, cujos benefícios ainda: agora estamos colhendo.
As nossas labiatas, purpuratas e certas espécies de Oncidium causavam o maior sucesso, e, ainda hoje, nas: veias de muitos híbridos famosos, vemos o sangue das nossas espécies silvestres.
Créditos: Valdemir de Oliveira Ricci
Francisco Cava Cano
Um advogado de Piracicaba, interior de São Paulo, começou ajudando um colecionador Cafelândia, Julio Vendramel , no replantio das suas orquídeas, e em troca, ele passou a orienta-lo sobre o cultivo dessas plantas e se transformou num dos orquidófilos mais importantes na introdução das especies Sul-americanas em especial da Colômbia e Venezuela. Muitas coleções de C. trianaei, C. quadicolor, C. gaskeliana, C. mendelli, C mossiae, C. lueddemannianas, e muitas outras especies que hoje estão espalhadas pelo Brasil, devem muito a este homem.